É uma doença em que a córnea apresenta aumento de sua curvatura de forma irregular, com tendência ao formato de um cone, causando principalmente astigmatismo irregular, que prejudica a qualidade e o alcance da visão.
De acordo com o Conselho Brasileiro de Oftalmologia (CBO), a cada 100.000 pessoas no mundo, de 4 a 600 delas desenvolvem o ceratocone.
O Ceratocone tem aparecimento na adolescência e costuma progredir com maior frequência até os 30 anos de idade. É uma doença que acomete ambos os olhos, porém na maioria das vezes de forma assimétrica, isto é, um dos olhos apresenta um grau de ceratocone mais avançado do que o outro.
As córneas dos pacientes com ceratocone apresentam afinamento na região do encurvamento da córnea. Há alteração da biomecânica da córnea, isto é, a córnea apresenta menor rigidez e com isso pode sofrer alterações de curvatura e espessura no ceratocone.
Há estudos que comprovam a predisposição genética da doença, entretanto o principal fator que contribui para o desenvolvimento da doença é o ato de coçar os olhos, seja devido a alergia ocular ou devido ao quadro alérgico do organismo ou rinite alérgica. Não coçar os olhos e tratar a alergia ocular são fundamentais para evitar a progressão do Ceratocone.
O Ceratocone é uma doença que não tem cura, porém há vários tratamentos para o controle da doença e para a reabilitação da visão. Para controle do Ceratocone temos o Tratamento da Alergia Ocular e a cirurgia de Crosslinking da Córnea. Para a reabilitação da visão em pacientes com Ceratocone temos como opções: os Óculos, as Lentes de Contato, o Implante de Anel Intraestromal e o Transplante de Córnea. A condução do tratamento do ceratocone deve ser feita por médico oftalmologista especializado, que analisa diversos fatores para indicar a melhor forma de tratamento personalizado para cada paciente.
O que é o Crosslinking da Córnea e quando é indicado?
O Crosslinking Corneano é um procedimento cirúrgico com objetivo de estabilizar o Ceratocone. Ele é indicado quando verificamos que o ceratocone está progredindo, isto é, há aumento da curvatura da córnea, e assim pode ocasionar perda de visão do paciente.
Qual o efeito do Crosslinking?
Este procedimento cirúrgico promove ligações entre as fibras de colágeno da córnea, deixando-a mais rígida e estável. Há estabilização em mais de 90% dos casos. Assim, evita-se a progressão da doença e a necessidade de realizar um transplante de córnea. Entretanto, esta técnica não visa a melhora da visão dos pacientes.
Como é feita esta cirurgia?
A cirurgia é realizada dentro de um centro cirúrgico, mas é considerada uma cirurgia da superfície da córnea. Ele é realizado com anestesia tópica, com uso de colírio anestésico, assim não há dor durante o procedimento. Após a remoção do epitélio da córnea, há aplicação de um colírio especial à base de riboflavina (vitamina B2), que é ativado por um feixe de luz ultravioleta. Isso estimula a contração e a união das fibras de colágeno, o que aumenta a resistência da córnea e reforça sua estrutura. Por fim, é colocada uma lente de contato, com função de curativo, até que o epitélio se regenere. Esse processo leva em torno de sete dias e, depois desse prazo, a lente deve ser retirada.
Como é a recuperação da cirurgia de Crosslinking?
O paciente deverá utilizar um colírio antibiótico por cerca de dez dias e um colírio anti-inflamatório por, aproximadamente, um mês. Além de colírios lubrificantes. A lente de contato é retirada na primeira semana no consultório. A visão fica embaçada e irá retornar gradativamente à medida que ocorre a cicatrização da córnea. Nos primeiros dias, é normal sentir irritação, lacrimejamento e sensação de corpo estranho.
Deve-se evitar uso de celular, tablet e computador nos primeiros 2 dias após a cirurgia. É liberado assistir TV e não há restrições alimentares. Muito cuidado ao se expor em ambientes ao ar livre, sempre usar óculos com proteção contra raios ultravioleta. Não entrar em água de praia, piscina ou rio por pelo menos 30 dias.
Quais os riscos da cirurgia de Crosslinking?
Os riscos envolvidos no Crosslinking são raros pois é uma cirurgia na superfície da córnea. Pode ocorrer infecções no período em que a córnea ainda não cicatrizou completamente e opacidades chamadas de haze. Nenhum procedimento em medicina é isento de riscos, entretanto a cirurgia de Crosslinking é considerada uma cirurgia segura.
Todo paciente com Ceratocone deve passar pelo exame de refração, no qual o médico oftalmologista verifica qual o grau que cada olho apresenta. Mesmo em casos de grau moderado ou avançado, esta etapa deve fazer parte da consulta oftalmológica.
Qual é o “grau” de quem tem Ceratocone?
Na maioria dos casos de Ceratocone, encontra-se o “grau” de miopia e de astigmatismo. Após realização de Implante de Anel e Transplante de Córnea para Ceratocone, podem ocorrer mudanças.
Quem tem Ceratocone pode usar óculos de grau?
Sim! Os óculos são a primeira opção de correção da visão. Nos casos mais leves de Ceratocone, é possível ter óculos que possibilitem uma boa visão. Os óculos terão correção limitada da visão nos casos moderados e avançados, pois o astigmatismo está aumentado e há irregularidades na curvatura da córnea. Assim, prossegue-se com a avaliação para Lentes de Contato para Ceratocone e Implante de Anel.
As lentes de contato são muito úteis para a melhora da visão em pacientes com Ceratocone. Durante o teste de adaptação de lentes, já é possível ter ideia do resultado visual que as lentes irão proporcionar.
Quais tipos de lentes são indicadas para Ceratocone?
É possível usar todos os tipos de lentes de contato, vai depender de cada caso. O médico oftalmologista especialista em lentes de contato é o profissional capacitado e, portanto, o mais indicado para realizar esta avaliação e proceder com a adaptação das lentes. Ele irá fazer a indicação do melhor tipo de lente a ser usada, além de fazer os ajustes e o acompanhamento do uso das lentes de contato. Temos as seguintes opções:
- Lentes de Contato Gelatinosa Esféricas e Tóricas – são mais confortáveis, corrigem a visão de forma equivalente aos óculos; assim, teremos melhores resultados em pacientes com grau inicial de Ceratocone;
- Lentes de Contato Rígidas Gás Permeáveis (RGP) – conseguem melhora o alcance e a nitidez da visão, pois formam um conjunto óptico mais regular com a córnea e a camada de lágrima, permitindo melhor focalização da imagem pelo olho; não deve ocorrer deformação da córnea e estas lentes devem ter certo movimento para lubrificação e oxigenação adequadas dos olhos; são indicados para casos moderados e avançados de Ceratocone;
- Lentes de Contato Esclerais – da mesma forma que as lentes RGP, há correção do alcance e da nitidez da visão; estas lentes precisam ser preenchidas com soro fisiológico estéril em flaconetes; são indicados para casos avançados de Ceratocone e nos casos de córneas muito irregulares;
Qual o tempo de troca das lentes?
Isso dependerá do tipo da lente indicada. Deve-se seguir as orientações do médico oftalmologista para evitar complicações com uso de lentes de contato.
Quem usa lentes de contato não precisará mais ter óculos?
Não. Todos que usam lentes de contato devem ter óculos, mesmo que não ocorra grande melhora da visão, como opção nos dias em que ocorrer alguma irritação nos olhos ao usar lentes de contato.
O Anel Intraestromal é também conhecido como “Anel de Ferrara”, pois foi desenvolvido e, pela primeira vez, implantado em portadores de Ceratocone pelo médico oftalmologista Dr Paulo Ferrara.
O que o anel faz no olho?
O Anel Intraestromal é implantado dentro das camadas da córnea e causa alteração da sua curvatura. Assim, o Implante de Anel Intraestromal promove:
- regularização do astigmatismo
- redução do astigmatismo
- redução das aberrações ópticas do olho
Com isso, há melhora da visão sem óculos e também com correção.
Qual melhor tipo de Anel Intraestromal?
O melhor tipo de anel será definido pelos guias dos fabricantes e experiência do médico. Deve-se considerar a visão com correção, o tipo e a quantidade de grau do olho, o formato, a posição e a intensidade da curvatura do ceratocone. Há modelos diferentes de anel e variam de arcos de 90° a 325°.
Quanto de “grau” é corrigido com a cirurgia do anel?
O resultado do Implante de Anel Intraestromal é variável, pois depende da resposta de cada córnea pois apresentam propriedades elásticas diferentes. Atualmente, há diversos estudos para achar essa resposta e podermos realizar exames capazes de medir as propriedades biomecânicas da córnea e sua resposta às cirurgias.
Como enxerga uma pessoa com anel?
Os pacientes submetidos a cirurgia de anel enxergam com mais nitidez e qualidade do que antes da cirurgia. Em alguns casos, será necessária a correção da visão complementar com óculos ou lentes de contato. O resultado da modificação da visão é gradual e fica mais estável após 3 meses da cirurgia.
O anel pode ocasionar visão com reflexos em situações de ambiente escuro, pois a pupila pode estar mais dilatada que o diâmetro do anel implantado.
Quanto tempo dura o anel?
Como o anel é feito de material acrílico e inerte para o nosso organismo, não há reação de rejeição ou alergia ao material. Assim, o anel pode ficar a vida toda na córnea.
Atualmente o transplante de córnea é cada vez menos indicado para pacientes com Ceratocone, devido ao diagnóstico mais precoce da doença e assim resolução com Lentes de Contato para Ceratocone e Anel Intraestromal, bem como a utilização da técnica de Crosslinking para evitar a progressão da doença.
Como fica a visão após o Transplante de Córnea?
A visão após a cirurgia de transplante de córnea é variável de acordo com a resposta de cicatrização de cada pessoa. Na fase inicial, há grande reação inflamatória no olho, o que exige muitos cuidados e uso de colírios antiinflamatórios, antibióticos e lubrificantes. Após 3 meses da cirurgia, inicia-se o processo de avaliação para retirada gradual dos pontos. Isso é determinado de acordo com a medida da visão, o “grau” de astigmatismo e o processo de cicatrização, e demanda visitas mensais ao médico oftalmologista.
Há novidades no Transplante de Córnea?
Na técnica tradicional de transplante, chamada de Transplante Penetrante, é feita a retirada de todas as camadas da córnea do paciente e substituição por uma córnea de um doador também com o mesmo corte de todas as camadas.
Na última década, ocorreram avanços no transplante da córnea, e temos a possibilidade de realizar transplantes de apenas algumas camadas da córnea. Estes transplantes são chamados de lamelares e permitem recuperação mais rápida e menor chance de rejeição quando comparados com os transplantes penetrantes.
Quais as vantagens do Transplante Lamelar Anterior?
Os resultados de visão após Transplante Lamelar Anterior são semelhantes aos encontrados na técnica tradicional, do Transplante Penetrante. As vantagens se referem à preservação do endotélio do receptor, levando a um menor risco de rejeição endotelial e um maior tempo de sobrevivência do transplante.
A técnica do lamelar anterior é muito delicada e pode ocorrer a necessidade de conversão para técnica tradicional durante a cirurgia.
Tendo a indicação confirmada, como faço um Transplante de Córnea?
É necessária a avaliação de um médico oftalmologista especialista em córnea. É feita a inscrição do paciente na fila estadual. Não há taxas a serem pagas pela córnea. A fila é única em cada estado, independente se a cirurgia será feita pelo SUS, convênio ou particular.
Infelizmente há grande fila para transplante de córnea pois há dificuldades de captação pelos Bancos de Tecidos Oculares, além de pouca informação para a população e baixos índices de doação de córneas. No Brasil, em março de 2023, havia 22.757 adultos e 583 crianças à espera desta cirurgia, segundo dados da Revista Brasileira de Transplantes, da Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos (ABTO).